14 março 2011

Contando uma história

E bem longa...
Fui motivada a escrever este texto, depois de analisar o curso que minha vida tomou nestes últimos anos.
Nossas vidas são cheias de fases e agora estou partindo para uma nova e diferente etapa da minha vida.
Eu sempre fui muito ligada a minha mãe, talvez por ser a filha mais nova, ou por ser a mais delicada, ou por receber mais atenção por parte dela, ou ainda por não ser muito querida pelo meu pai, que certamente não gostava muito da minha fragilidade e obviamente considerava
isso como sendo fraqueza. Provavelmente por isso ele era bem duro comigo, ele agia quase com um quê de desprezo e eu podia perceber alguma maldade irônica nas suas atitudes, mas considero tudo isso como águas passadas e já consegui eliminar toda mágoa que sentia dele.
Quando meus pais finalmente se separaram, minha irmã e eu ficamos sob a guarda do meu pai. Mesmo não tendo filhos, posso imaginar como isso foi duro para minha mãe. Creio que este tipo de situação não é comum nos dias atuais e a prioridade é das mães, principalmente no caso de meninas! Por estar se falando muito em pedofilia, que na verdade sempre existiu, quero deixar bem claro que nunca fomos molestadas por meu pai.
Na ocasião da separação, eu estava com oito e minha irmã com onze anos e distanciar-me da minha mãe com esta idade não foi nada fácil, fui mal na escola, perdi o ano e para complicar, ainda tinha que conviver com uma avó paterna que não gostava muito de mim, talvez por eu ser a mais parecida com a minha mãe.
Enquanto meus pais estiveram juntos, nós nunca havíamos apanhado porque minha mãe preferia conversar e colocar de castigo. Bater nunca! Foi esta a educação que ela recebeu dos pais. Já meu pai, viu o irmão sendo maltratado por inúmeras vezes e provavelmente apanhou também, e foi assim que começou a agir com as filhas e passou a bater por qualquer coisa. Lidar com esta nova situação, pela qual nunca havíamos passado, foi muito difícil e não suportando mais, fugimos de casa. Aconteceram três fugas, sendo que na última, conseguimos encontrar a casa da minha mãe. Na época foi muito duro passar por isso, mas hoje quando lembro dos detalhes das fugas, tenho muita vontade de rir.
Quando conseguimos encontrar minha mãe, já haviam se passado alguns anos após a separação, minha irmã estava com quinze e eu com doze anos. Imaginem uma garota de quinze anos, apanhando do pai no meio da rua, levando um tapa no rosto e a troco de nada! Em casa, além dos tapas no rosto, ocorriam as surras e apanhávamos de cinta!
Para resumir, minha mãe procurou um advogado, passamos por audiências judiciais e conseguimos ficar com ela. Minha irmã, apesar de tudo, sempre foi muito ligada a meu pai e manteve contato com ele. Eu nunca mais quis vê-lo, foi uma opção minha e não me arrependo, não fiz por maldade, sempre gostei de agir de acordo com meu coração e eu não tinha vontade de vê-lo. Como já disse antes... Águas passadas!
Comecei a trabalhar com quatorze anos, mas antes disso, minha irmã passou a trabalhar fora e eu passava o dia com a minha mãe. Ficava com ela no trabalho e aonde ela ia, eu ia junto. Lembro-me que nós duas sempre passávamos por uma avenida linda que tinha um canteiro entre as duas vias e no final dela havia um prédio residencial enorme. O prédio ficava de frente para a avenida, era bem largo, imponente, lindíssimo e muito charmoso. Ele era rodeado por inúmeras sacadas e todas eram verdinhas por terem muitas plantas nas floreiras. Nós ficávamos olhando e admirando o prédio enquanto passávamos ao longo da avenida e sempre dizíamos que adoraríamos morar nele! Um sonho que na época seria inimaginável considerando nossa condição financeira!
Minha mãe sempre sonhou com a casa própria. Mas quem não sonha com isso? Infelizmente ela não teve este prazer! Ela contava que meu pai poderia ter adquirido um terreno e ter construído uma casa, mas ele nunca concordou em fazer isso e preferiu pagar aluguel a vida inteira.
Depois que minha irmã se casou e foi morar em outra cidade, ficamos minha mãe e eu, vivendo juntas por muitos anos. Meus pais vieram para o Brasil, logo após a segunda guerra mundial, por isso não temos outros familiares, então éramos minha mãe e eu... Eu e minha mãe.
Um belo dia, minha mãe disse brincando que tinha um pretendente e eu continuei a brincadeira dizendo que daria o maior apoio, e apesar de estar brincando ela sabia que eu dizia a verdade por já ter dito a ela que deveria ter alguém. Ela nunca teve ninguém depois do meu pai.
Ela começou contando que quando ia para o trabalho, sempre passava por uma praça onde de vez em quando encontrava a D. Isolina, uma senhora idosa muito amiga dela. Esta senhora ficava sentada no banquinho da praça conversando com vários amigos e sempre que minha mãe a via, parava e conversava um pouco e assim ficou conhecendo as outras pessoas do grupo e entre elas, estava este pretendente. Era um senhor, muito mais velho que minha mãe, do qual não me recordo o nome e que nem cheguei a conhecer. Minha mãe disse que em um belo dia, sem mais nem menos, ele propôs casamento! Eu disse a ela: Como assim? Sem te conhecer direito? Aí ela me contou a história toda.
Disse que ele foi muito franco ao relatar o porquê da proposta, contou a ela tudo o que os outros já sabiam e qual era a real situação dele. Disse que morava sozinho e fumava muito, por volta de três maços de cigarros por dia e por isso estava com problemas no pulmão, que seu médico já o havia alertado de que se não parasse de fumar imediatamente, teria sérios problemas e que não viveria por muito mais tempo. Disse também, que era viúvo e morava só por não se dar bem com a filha que não gostava dele, ela só queria seu dinheiro e nunca se preocupou com ele, e por este motivo não queria deixar nada para ela. Ele sabia que a esta altura da sua vida, não conseguiria deixar um vício tão terrível como o do fumo e que seu fim estava próximo. Por tudo isto, estava à procura de uma pessoa que precisasse e que merecesse ajuda, e que minha mãe havia sido recomendada pela amiga que tinham em comum, como sendo uma pessoa honesta, de vida simples e de bom coração. Deixou claro que não dormiriam juntos e que não seriam um casal, que poderia levar a filha de morar com ela, que seriam apenas bons amigos e que permanecessem casados até o seu fim para que, pelo menos o apartamento, não ficasse para a filha dele.
Bem! E depois de tudo isso, vem o mais incrível!
Adivinhem onde este senhor morava?
Sim! Exatamente! Naquele prédio! Aquele... Daquela avenida linda... Com aquelas floreiras todas!
Eu olhava para minha mãe sem saber direito o que dizer a ela, só sabendo e sentido o que é o correto.
Quais as minhas conclusões? Que nada vem para nós de forma gratuita, que poderíamos nos dar muito bem com ele e viver tranquilamente da forma como ele imaginava até sua partida e realizar seu desejo, que nada seria fácil e simples como ele estava colocando, que por mais que ele tivesse suas razões, a filha dele tinha seus direitos e lutaria por eles, e sendo assim, nós passaríamos por situações embaraçosas e desagradáveis. E por fim, fiquei me perguntando se tudo isso valeria a pena? Não sei!
Provavelmente minha mãe pensava da mesma forma que eu e tomou sua decisão, porque o tempo foi passando e a conversa caiu no esquecimento.
Depois de muito tempo, minha mãe adoeceu e veio a falecer, assim como manda a lei da vida, assim como as coisas tem que ser, mas que são tão difíceis de vivenciar.
Eu continuei vivendo... Sofrendo muito pela sua falta... Chorando muito... Por um longo tempo... Assim como todo mundo que perde alguém muito querido!
Sempre procurei aproveitar todas as boas oportunidades profissionais que apareciam e assim cheguei ao ponto de poder comprar minha tão sonhada casinha.
Em um dia de folga, fui ao banco e constatei que era um sonho possível de ser realizado. Comprei um jornal e fui para casa. Depois de ver os anúncios, liguei para alguns e numa destas ligações falei com uma moça chamada Nair, perguntei a ela o que queria saber sobre o imóvel e pedi algum ponto de referencia para saber onde ficava. Desliguei o telefone e fui ver em um mapa, onde ficava a tal rua que eu não conhecia e fiquei pasma com o que vi, eu olhava e não conseguia acreditar! Imediatamente liguei para a moça e perguntei se era um prédio assim... dei toda a descrição... e ela confirmou! Isso já eram umas 17:00 hs! Disse a ela que me aguardasse porque estava indo ver o imóvel naquele momento. Como eu morava relativamente perto, fui a pé até lá e minha cabeça fervilhava pelo caminho, mil coisas vinham à minha mente, principalmente a lembrança da minha mãe e da época em que passávamos pelo prédio admirando sua imponência.
E assim se cumpriu o destino. Comprei um apartamento no prédio que tanto adorávamos e jamais em minha vida imaginei que isso seria possível! Era um sonho realizado, mas do qual, infelizmente minha mãe não poderia participar.
Para que esta história toda possa fazer sentido, voltarei um pouco no tempo, para a época em que minha mãe e eu ainda estávamos juntas.
Minha mãe fez muitas coisas na vida para se manter e uma delas, foi dar aulas particulares de alemão aos sábados. Assim conheceu um rapaz que tinha como objetivo ser piloto de avião, por isso estudava alemão, além de inglês. Diversas vezes, ao voltar para casa do trabalho, eu encontrava minha mãe batendo papo com este aluno, ele adorava ouvir as histórias que ela contava sobre a época em que viveu na Europa. Por saber que minha mãe nasceu na Hungria, este rapaz apresentou a ela, um amigo de infância que tinha descendência de húngaros. Não me recordo agora exatamente como ocorreu, mas fiquei conhecendo este rapaz também e na ocasião nem sequer passava pela minha cabeça e nem poderia imaginar, que um dia ele seria meu marido! Encantado com as histórias da minha mãe, o aluno a apresentou para uma outra amiga, esta de origem chilena. Certo dia, este aluno convidou minha mãe para assistir a uma apresentação de um grupo de dança folclórica e consequentemente fui convidada também, e assim fomos todos, o aluno, seus dois amigos, minha mãe e eu. Nesta época, não sei precisar, mas eu estava com mais ou menos vinte e cinco anos, idade muito próxima a do aluno e de seus amigos. De tanto irem á minha casa, tornamo-nos amigos e passamos a sair juntos de vez em quando para nos divertirmos. Não preciso nem dizer o que passava pela cabecinha da minha mãe, por ela eu começaria um namoro com o amigo do aluno, que tinha descendência húngara e que fisicamente era bem parecido com meu pai, alto, forte e loiro, uma das diferenças entre eles é que o rapaz tinha olhos azuis e os do meu pai eram castanhos. Mas não foi o que aconteceu, e acabei namorando com o aluno dela. Namoramos talvez por um ano e terminamos. Enquanto isso o amigo do aluno conheceu uma moça e viveu com ela por muitos anos e assim nos afastamos e cada um foi viver sua vida.
Agora vou continuar do ponto onde estava antes, na época em que comprei o apartamento no tão sonhado prédio.
Por termos morado durante quinze anos no mesmo lugar, assim que me mudei para a nova casa, peguei a agenda e decidi ligar para pessoas que me conheciam e também para algumas que conheceram minha mãe e informar sobre a mudança de endereço. Entre estas pessoas estava o amigo de infância do aluno da minha mãe. Liguei, mas não consegui falar e deixei um recado no celular.
Depois de alguns dias ele entrou em contato comigo e conversando pelo telefone descobrimos que éramos quase vizinhos e que estávamos morando no mesmo bairro. Muita coincidência! Não acham?
Por muito tempo, ele viveu a maior parte do tempo fora de São Paulo morando com a companheira. Havia se mudado para o apartamento atual, alguns meses antes de eu me mudar para o meu!
O reencontro com este amigo aconteceu depois de uns treze ou quatorze anos. Fiquei feliz por ter feito contato com ele, por ser uma pessoa que conhecia minha mãe e por ter um amigo para conversar. Sempre achei que um dia ele voltaria a viver com a companheira, já que ficaram juntos por muitos anos e que o afastamento deles seria apenas um desentendimento passageiro. Mas não foi o que aconteceu.
Ficamos amigos por alguns meses, nos apaixonamos e começamos a namorar, até que decidimos nos casar. Cada um vendeu seu apartamento, compramos um melhor para vivermos juntos e é claro que foi no querido prédio em que eu já morava. Assim se passaram aproximadamente dez anos e agora cada um segue seu caminho.
Sendo assim, é preciso vender esta casa para que cada um de nós possa ter seu canto e continuar sua jornada.
Conclusão! Analisando tudo o que aconteceu comigo, percebi que vivi tudo isso realizando os sonhos da minha mãe, morar no prédio que ela tanto sonhou e me casar com o rapaz que ela idealizou para mim!
Eu estava muito feliz por morar em um prédio que era querido por mim e por minha mãe e me sentia em casa com isso, e também fui imensamente feliz com a pessoa com a qual me casei. Eu não vivi tudo isso pensando na minha mãe. Eu realmente desejei morar neste prédio e um dia me apaixonei verdadeiramente pela pessoa com a qual me casei.
Então? Como tudo isto está interligado?
Tudo isso sempre esteve muito presente em meu pensamento e sempre tive curiosidade para saber quem era aquele senhor que queria ajudar minha mãe e em que local do prédio ele morou, sempre tive esta curiosidade, mas nunca fui a fundo e nunca perguntei sobre ele por aqui, até porque não sei qual é o seu nome e o que sei sobre ele é muito vago!
Toda esta história foi revigorada na minha cabeça, em um segundo!
Isso aconteceu em uma noite, quando houve um grave acidente com um caminhão bem em frente ao prédio. O barulho foi tão estrondoso que todos desceram para ver o que havia acontecido. Apesar de ter sido um acidente grave, não houve vitimas e as pessoas que desceram ficaram conversando descontraidamente. Eu conversava sobre amenidades com duas moradoras, quando passou uma senhora muito bem vestida e uma delas não se conteve e comentou que “um velho deixou muito dinheiro para ela e quando isso aconteceu, ela era bem jovenzinha”.
É claro que não revelei meus pensamentos, principalmente por ter sido um comentário maldoso e com ar de fofoca, mas vocês podem imaginar o que imediatamente me veio à mente após ter ouvido isso!
Será que aquele senhor chegou a se casar com alguém? Será então, que foi esta senhora que se casou com ele?
Por enquanto não tenho essas respostas. Talvez elas ainda venham a aparecer.
Quem sabe, essas respostas possam aparecer depois de a minha querida vizinha Nair, ler esta história que acabei de escrever, ela mora aqui no prédio há muitos anos e pode ter ouvido falar sobre este senhor.
O texto acima é de minha autoria.

No link abaixo, vocês vão encontrar o seguinte texto:
A linguagem das coincidências - Compreenda como perceber as repetições e use-as a seu favor

10 comentários:

  1. Amiga
    Passei por aqui e adorei ler e saber um pouco sobre vc e sua vida!!!
    Pessoa forte,corajosa...como devemos e precisamos ser,mas que é frágil e de uma grande sensibilidade!!!
    Que Deus a proteja poderosamente!!!
    Bjussss

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  2. Fogo Cris...grande história mesmo....mas muito linda....fiquei pasmada diante do monitor pois para além de escreveres muito bem, contaste com pormenores que mais parecia uma novela...é incrível as coincidências que tiveste na tua vida e realmente deixou-me de boca aberta...caramba...quem diria.A principio adorei o "conto de fadas", do rapaz que reencontraste e deu em casamento...depois ficou uma tristeza...pena..parece que >ás vezes o destino dá-nos directrizes e de repente, tudo fica sem nexo....
    Bem, mas eu é que já estou a falar de mais...mas vai em frente Cris e força para a tua nova fase de vida.
    Beijinhos

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  3. Olá, Eliane. Adorei sua visita! Será sempre bem vinda. Que seu caminho seja iluminado! Obrigada Bjs

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  4. Oi, Ana (sonhadora). Eu mesma acho esta história toda incrível. Muitas coincidências! Obrigada por visitar-me. Mil bjs

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  5. Parabéns pelo seu dia blogueira linda!
    bjusss

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  6. Olá, Suzie.
    Muito obrigada por visitar e por deixar um comentário!
    Volte mais vezes!
    Mil bjs

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  7. Linda historia, você é uma mulher de fibra, deveria escrever um livro pois escreve muito bem e suas maluquices como falou prendem nossa atenção. Parabéns por de alguma maneira você ajudar muitas pessoas. Você é especial. Que Deus continue te iluminando e te dando muita força e te enchendo de bençãos sem fim. Beijos no seu coração

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  8. Olá, Marilia.
    Você acertou! Eu adoraria escrever um livro e muitas pessoas devem ter este sonho! Eu sofri muito com a fibromialgia e fico feliz em poder levar algum conforto para pessoas que estejam passando pelo mesmo problema. Muito obrigada pela visita e pelas palavras.
    Mil bjs

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  9. Querida amiga, linda sua história, adorei ler e fiquei impressionada, pois é uma mulher de fibra, corajosa,batalhadora, te admiro muito, e com certeza voce poderia ser escrever um livro.....
    E muito obrigada amiga, pois com certeza está ajudando muitas pessoas.... vc e muito especial....
    Beijos com carinho.. Elza

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  10. Olá, Elza. Essa história é mesmo impressionante! Obrigada por ter gostado do que viu. Fico sempre muito feliz em poder compartilhar e ajudar. Adorei seu comentário! Este pedacinho da net é nosso e será sempre bem vinda. Mil bjs

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